
03 Feb A participação das crianças pode transformar as cidades
Por Raika Julie Moisés
Na sua visão de gestora pública, em que consiste uma cidade amiga da criança?
É uma cidade que proporciona um conjunto de vivências e experiências para as crianças, que contribuem para seu pleno desenvolvimento físico, cognitivo, psíquico e emocional. Uma cidade amiga da criança deve ter, entre outras coisas:
– Segurança nos deslocamentos – a pé, de bicicleta, de ônibus ou de carro, especialmente nos trajetos cotidianos, como o caminho entre a casa e a escola.
– Qualidade dos espaços públicos – parques, praças, ruas e calçadas, que apresentem elementos lúdicos e incentivem o convívio social e o brincar.
– Presença da natureza – mais árvores, jardins, gramados, fontes, rios, campinhos de terra e areia, para contemplação, contato e diversão de crianças e adultos.
Estas condições favorecem o processo de aprendizagem das crianças, incentivando sua autonomia.
Como foi o processo de elaboração do Plano Diretor da Cidade de Jundiaí? Quais as principais limitações vivenciadas e o que ajudou a superá-las?

Crianças do comitê de Jundiaí em visita técnica. Foto: Prefeitura de Jundiaí
O processo de revisão do Plano Diretor de Jundiaí teve início em 2017, no Fórum de Avaliação do Plano Diretor, e se estendeu por dois anos até sua aprovação (Lei Municipal n° 9.321, de 11 de novembro de 2019). Pela primeira vez, o plano diretor apresenta um capítulo dedicado exclusivamente à criança na cidade, que define com clareza os objetivos e as diretrizes das políticas públicas para garantia dos direitos das crianças no espaço urbano. Há certo consenso entre os adultos de que as cidades precisam ser mais amigáveis e menos violentas para todos, principalmente para os mais frágeis. Os conflitos surgem no momento de definir como isso deve acontecer – por exemplo, ao propor a redução da velocidade de automóveis em algumas ruas da cidade.
Como oferecer espaços públicos que sejam atraentes para todas as gerações?
Primeiro, reconhecendo as necessidades de cada faixa etária e oferecendo equipamentos que atendam aos seus interesses específicos. Depois, proporcionando espaços de convivência entre as gerações, ambientes que possam ser partilhados por avós e netos, pais e mães com crianças pequenas ou filhos adolescentes.
Essa diversidade, não apenas de idade mas também de gênero, de classe social e de estilo de vida, é uma das melhores formas de promover a identificação das pessoas com o território – o que ajuda na conservação dos espaços, além de trazer uma sensação de vitalidade urbana e segurança social.
Como envolver crianças e adolescentes no processo de planejamento urbano?

Em Jundiaí, crianças e adolescentes participam do planejamento urbano. Foto: Prefeitura de Jundiaí
É preciso oferecer oportunidades para que a criança e o adolescente digam o que gostam ou não gostam na cidade, quais suas demandas mais importantes e quais as soluções que eles imaginam para os problemas apontados. No ano de 2018, foi criado em Jundiaí um Comitê de Crianças, formado por 28 meninos e meninas de 8 a 10 anos de idade, de diferentes partes da cidade. Eles se reúnem uma vez por mês para discutir a cidade e eleger prioridades, apresentadas ao final do ano ao chefe do Executivo. Em dezembro de 2019, o prefeito recebeu a carta das crianças e se comprometeu a atender alguns dos pedidos. O documento traz propostas como a construção de praças com espaços para brincadeiras em todos os bairros da cidade, instalação de radares de velocidade em frente às escolas e aponta ainda sugestões como a construção de um parque público para crianças de todas as idades, a redução da poluição, o reforço na arborização e a proibição da venda de armas à população. O “Comitê das Crianças” e as “Ruas de Brincar” são exemplos de programas que dão protagonismo às crianças nas tomadas de decisão, e reforçam a importância do brincar. São ações que resultam da parceria do Município com o Instituto Alana – Programa Criança e Natureza – e da adesão à Rede Latino-americana de Cidades das Crianças. Jundiaí é o primeiro município do estado de SP e segundo no país a integrar esta Rede, logo após Boa Vista, em Roraima.
Por que uma cidade amiga da criança é boa para todos?
Porque é uma cidade mais humanizada, mais divertida, mais segura, onde o ritmo acelerado dos adultos pode dar espaço ao tempo de descoberta das crianças, à curiosidade, à criatividade, à delicadeza. É uma cidade onde as calçadas convidam para caminhadas e os espaços públicos incentivam o convívio social. Onde a natureza não é apenas cenário, mas parte da brincadeira. Onde é permitido pisar na grama e subir em árvores. Como diz o educador Francesco Tonucci, crianças são como vagalumes – indicadores de qualidade ambiental. Quando não estão por perto, é sinal de algum desequilíbrio no sistema. Esta é uma imagem que acho linda!
Saiba mais:
MISSÃO TÉCNICA – FREIBURG, ALEMANHA